segunda-feira, 7 de junho de 2010

“Ador é inevitável, o sofrimento é opcional”

Amar-me. Para evitar necessidades desnecessárias de amor, atenção e carinho, que em doses exageradas pode destruir coisas.
Conhecer-me. Para evitar criticas desnecessária, evitar conflitos internos, evitar exageros; conhecer meus limites.
Doar-me. Para não carregar sozinha as coisas boas.
Privar-me. Para evitar transferir coisas ruins para os demais.
Conformar-me. Para evitar sofrimentos.
Respeitar-me. Para ter respeito.
Desculpar-me. Para não carregar o ódio e a culpa, e poder perdoar.
Não criar expectativas. Para não me frustrar.
E se eu estiver mentindo para mim mesma? Enganando-me? Então eu devo mentir muito bem!

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Amanhã fará

A liberdade de poder estar, entre os dedos e entre o vento
O que acalenta e afaga, amedronta e desespera
Hoje vontade, amanhã saudade
Hoje tesão, amanhã amizade
Hoje dúvida, amanhã certeza
Hoje você e sempre ninguém
Ela escrevia essas palavras e em um tom de não saber o que se passava ali dentro de si mesma. Ás vezes falava demais, ás vezes de menos. Escrevia para tentar entender, pensava para tentar entender, mas não tinha o que entender.
Ás vezes indiferença, ás vezes amor, ternura.
Mas sua indiferença já incomodava aos demais, o que certamente lhe incomodava também.
Tinha tanto o que fazer e o ócio e o tédio tomavam conta dela... e tremia... e fervia
Achava que viver era assim, excitante simplesmente!
Queria sentir e viver tudo, e a cada dia percebia que as pessoas se conformavam com todas as regras e padrões de vida a seguir, e até mesmo algumas que diziam gostar de viver de algum modo diferente em algum aspecto, eram iguais, todos hipócritas iguais.
Tinha medo!Tinha medo de se frustrar, consigo mesma e com o rumo de sua vida.
Corria, brigava, insistia, respirava e fumava, destruía e construía um pouco a cada dia ... e no fim, percebera que nada precisava fazer sentido hoje, pois amanhã fará!

segunda-feira, 12 de abril de 2010

Liberdade - Fim da história de Jorge

Ana com sua ternura e seu grande coração, foi a família que Jorge nunca teve. Lembrava sua mãe. Além do nome, a beleza ofuscante e o brilho nos olhos.
Sofria de um câncer terminal no estômago. Numa noite foi internada na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, Jorge chorava desesperadamente, e já havia parado com os remédios que o psiquiatra receitou, pois era Ana que lembrava de seus horários e cuidava de Jorge.Desde que fora internada, ficou novamente desamparado.Era uma dor e uma falta muito grande.
O hospital estava cheio, cheio de gente, enfermos e alucinados de jaleco branco, e o desespero de Jorge aumentava a cada minuto.Falava sozinho e bem alto, andava de lado para o outro.Tentaram acalmá-lo de todas as maneiras, mas sua dor e desespero eram demais para se conformar.
Lembrava apenas de uma frase vinda dos doces lábios de Ana, aquela santa “Jorge, você é especial!”
__ Deixa eu ver a minha mulher, eu quero ver minha mulher, eu sou especial ...
Arrastado pelos seguranças do hospital, Jorge gritava e esperneava.
Foi a última noite de sua última vida.Ao receber a noticia que Ana havia falecido, caminhava sem nenhum objetivo, já sem lágrimas, sem pensamentos, sem nada.Lá de cima, carros passavam pra lá e pra cá, luzes, muitas delas acesas, e foi ali, naquele impulso, com um mergulho em meio aos carros que Jorge encontrou sua liberdade.

Zé ninguém

Seus anos na prisão foram longos, só esse período já daria um livro.
Chegou o dia!O dia que todos os presos sonhavam (exceto Jorge) – o dia da liberdade.
Ao sair pelo portão, Zóinho não tinha ninguém para recebê-lo, nem sabia para onde iria, muito menos quem era.Era como se tivesse acabado de nascer.Nascera com barba e uma longa e pesada história de vida para contar.
Não era mais Jorge há muito tempo, e agora que tinha saído da prisão, também não era mais Zóinho, era o Zé!Zé ninguém!
Voltou a pensão da Dona Judite, era o único lugar seguro que sua mente conseguia lembrar.Mas Judite não foi tão hospitaleira como imaginava que seria.Ele não tinha como pagar, e ele e seus irmãos já haviam deixado uma divida há anos atrás.
Perambulou algumas horas pela rua e a noite foi para um albergue.Não pregou os olhos a noite toda, velhos bêbados gritavam e discutiam, e cão de guarda latia alto e suas lembranças vinham todas as noites.Agora sem as drogas, nem as licitas, nem as ilícitas, o tormento era maior.Zé tinha medo de sair na rua, tinha medo de dormir, tinha medo de viver.
Numa de suas andanças a procura de uma esperança para sua vida, encontrou um dos “camaradas” que lhe vendia pó e pedra na sua adolescência.Macaco era como o conheciam.
Trocaram algumas palavras, e era tudo o que se lembrava daquela noite.
Os olhos pareciam estar grudados, fez muita força para abri-los, tudo girava e era tudo branco, tudo muito claro, em lugar estranho.Olhou ao redor, e ela dormia ali no sofá.Tinha um sono tranqüilo.Quem seria aquela mulher?
Com um sorriso, Ana despertou.Jorge não conseguia pronunciar uma palavra, pensava milhões de coisas, mas os remédios tinham o dopado tanto, que apenas saliva saia de sua boca.Ana segurou em suas mãos e contou sobre a alucinação que ele tivera depois de umas carreirinhas e outras coisas mais.
Ana era uma assistente social que conhecia Jorge de longa data.Ao perceber que ele não a reconhecia, se entristeceu ao perceber o que estava acontecendo com ele.Uma vida praticamente apagada pelos entorpecentes em doses excessivas.
Começava ali mais uma página em branco.Só se lembrava que era Jorge, nem Zóinho nem Zé, era Jorge.

segunda-feira, 22 de março de 2010

A prisão

Um quarto velho, alguns resquícios do pó e uns copos com gelo e resto de whisky sobre a mesa.
__ Vai Zoinho, trouxemos a missão pra você!
Os gelos se debatiam dentro do copo com os tapas na mesa, e os gritos, a risada alta se perdia meio ao volume do som que saía da vitrola velha.
__Vai Zoinho, arranca a roupa dela truta. Arregaça!
Quase chorando, Jorge, que naquele momento era Zoinho, como era chamado em seu meio, mandou uma carreira grande e fez o que queriam.Davam risadas altas e se satisfaziam consigo mesmo enquanto assistiam a cena e filmavam com o celular recém roubado da jovem.
A garota tinha a mesma idade de Jorge, e um futuro determinado, cheio de traumas e sofrimentos como ele.
Na mesma semana, seus “camaradas” fugiram, e Zóinho, que completara 16 anos, fora preso novamente. Mas dessa vez o crime era diferente, e a relação na FEBEM era outra.
Garotos da mesma idade e alguns um pouco mais velhos espancavam diariamente Zóinho. As regras eram iguais as da cadeia.Aquele lugar parecia uma cadeia de verdade.Dessa vez não teve como fugir, completou 18 anos e foi transferido para a penitenciária de gente grande.
A essas alturas, sua ficha já estava bem suja.Continuava sem proteção La dentro, e seus dias eram cada vez piores.
Jorge já nem se lembrava mais que este era seu nome.Não se reconhecia com aquela barba no espelho, não sabia mais quem era.Já não dormia mais, e uso das drogas, lícitas e ilícitas, era cada vez maior.

Naquela noite, a cadeia estava em fartura; sempre tinha um o outro que conhecia sua trajetória, eram conhecidos de seu falecido irmão, e se não podiam protegê-lo, o ajudavam com as drogas.
Esta noite foi o fim, o fim de uma segunda vida, que iniciara ao chegar em São Paulo.
Tudo girava, tudo escureceu, os sons dos gritos dos presos atordoados ficavam cada vez mais distantes.Jorge acordou deitado numa cama mais confortável do que a que costumava dormir na cela, não sabia onde estava.Nem imaginava o que teria passado na noite anterior.Uma overdose.
Depois daquela noite, Jorge nunca mais fora o mesmo. Intensificou seu tratamento com tarjas pretas, mas o uso das outras drogas não teve redução.
Suas alucinações aumentavam a cada dia.Parecia que nunca mais ficou são, parecia que estava sempre chapado de alguma droga, seja qual fosse ela.

domingo, 31 de janeiro de 2010

Parte II: Em São Paulo

Depois de alguns dias de caronas e aventuras, Jorge e Wagner, meninos ainda, chegaram a grande capital, por um momento se perderam naquela imensidão de gente correndo pra todo o lado na estação da Sé.Era incrível ... aquele trem, aqueles prédios, aquela quantidade de pessoas.Se assustaram, principalmente Wagner medroso que era.Mas ao se encontrarem novamente, voltaram a sorrir.Saíram desesperados e saltitantes em busca de algo que não sabiam bem o que era.
Algumas noites nas calçadas sujas de São Paulo procuravam o monumento da foto do postal que Antonio enviará a alguns meses atrás. Não sabiam se haviam achado o monumento, mas meio a tantas barracas e bugigangas, , aquele rosto iluminava a multidão: era Antônio, vendendo algumas delas também.
O encontro entre os três irmãos foi fervoroso. Abraçaram-se forte e conversaram um pouco.
Antônio estava numa pensão ali por perto, levou Jorge e Wagner e os três dividiam o quarto.

Naquela manhã, Jorge acordou assustado e suando. Olhou ao redor e seu irmão Wagner dormia um sono profundo e satisfeito, não quis interromper. Mas algo estranho estava acontecendo. Antônio já não estava mais no quarto.
__ Abre a porta muleque! Era Dona Judite, a dona da pensão. __ A polícia quer entrar ai!
__Acorda Wagner, acorda.
O quarto foi revistado e destruído pelos PMs.Os meninos foram levados as pressas para a delegacia.Antônio havia morrido naquela madrugada com uma troca de tiros com a polícia.Se não morresse, seria preso por porte ilegal de arma e contrabando.
Os meninos foram encaminhados para o juizado de menores, e sem sucesso, tentavam contato com a família dos meninos.
Não ficaram muito tempo, a rua era mais atraente que aquele lugar.E foi nas ruas que passaram longos anos de suas vidas.

Estavam diariamente dopados de cola ou pedra. Lhes tirava o sono, a fome e o frio.Se dormissem a noite, eram alvo de violência gratuita de jovens da região.
Numa noite dessas de confusão, a última coisa que Wagner viu fora os olhos negros e aflitos de Jorge.Estava com medo, aflito e confuso.Foi a última vez que estiveram juntos.Jorge tinha apenas 15 anos e já carregava consigo muitas dores.Em quinze anos de vida, perderá a mãe pra um desconhecido, o pai para o álcool, um irmão para a PM e agora outro irmão sabe-se lá para o que.

A cola de sapateiro se tornará infantil demais. O que divertia Jorge e o deixava se sentindo o super-homem eram seus dias de pó e pedra. Brigas com os traficantes eram constantes. Mas Jorge já havia se agregado a um bando de meninos que estavam na mesma vida que ele, alguns mais velhos, alguns mais novos. Para ter seus entorpecentes garantidos, fazia uns trampos para um dos donos de uma boca. Quando vacilava, eles não perdoavam, abusavam e espancavam Jorge. Ele era só mais um muleque perdido e sem proteção.
Foi levado diversas vezes para a então FEBEM, abrigos e juizados. Mas sempre arrumava um jeito de fugir.

domingo, 24 de janeiro de 2010

A história do Jorge - Primeira parte

"Me larga, me larga, me solta seu filho da puta.Filho da puta, filho da puta, filho da puta.Me solta, eu sou especial."
Era meia noite, e esses gritos vinham da rua.Gritos de desespero.O que seria ser especial?
Os seguranças todos do hospital estavam em volta dele, as árvores impediam que eu enxergasse com clareza o que acontecia ali.Mas era certo que o maltratavam e que não estavam com paciência.Diziam que o homem estava bêbado.E cada vez mais ele gritava, de onde tirava forças?

Jorge era seu nome.Nascido numa cidadizinha do Ceará, Tinguá.Vinte mil habitantes, um calor terrivel.A principal atividade da cidade era hortfruit, como costumavam chamar e a criação de galinhas.
Jorge era o segundo filho mais novo, depois dele o caçula era Wagner.Seu irmão mais velho se chamava Antõnio, eram em oito.
Seu pai, Josemar, criava algumas galinhas velhas e cansadas no fundo do quintal, e vendia os poucos ovos que elas davam.Sua mãe, Ana, era lavadeira profissional.Era uma das poucas na cidade que tinha um tanquinho.Lavava roupas de alguns hotéis da cidade.Não entendia o motivo, mas em época de verão, sempre tinha gente nos hotéis, principalmente aqueles gringos ricos.
Ana era uma mulher atraente, e naquela cidade pequena, eram poucas.Casou-se ainda bem jovem, teve Antônio com 13 anos de idade.Nunca amou seu marido Josemar, mas não podia desonrar seu pai entrando nessa modernidade de separação.
Durante esses anos todos de casamento, teve alguns casos escondidos, mas o mais recente fora uma paixão avassaladora.Joaquim era um homem dos negócios como costumavam dizer, morava em Fortaleza e ia para Tinguá uma vez por mês para fazer negócios com as hortfruit.No dia em que Joaquim viu Ana, foi tão avassalador quanto o dia em que ela se entregava em ardência á ele.
Alguns meses depois, não surpotavam mais a distância, e Joaquim propôs que Ana fugisse com ele.
Jorge tinha 13 anos.Ajudava seu pai alimentando as galinhas e nos finais de semana era guia turístico na cidade, conhecia o pessoal dos hotéis por causa de sua mãe, era uma troca constante.
Depois do sumiço de sua mãe, seu pai que já gostava de umas biritinhas, se entregou de vez á bebida.Seus irmãos mais velhos se viravam como podiam com uns bicos para colocar comida na mesa, mas um dia seu irmão mais velho, Antônio, foi embora para São Paulo, só souberam de seu paradeiro quando lhes enviou um postal do Viaduto do Chá, dizendo que estava bem e que era ambulante por ali mesmo, próximo a imagem do postal.
Seu pai estava cada dia pior, eles já não tinham muito o que comer, e Jorge também pouco dormia por causa dos gritos de pai embriagado.
Aquela noite Jorge foi o escolhido para os espancamentos de pai, gritava, se debatia, mas de nada adiantava, o homem continuava raivoso, por algo que aqueles meninos não tinham culpa alguma.
Nesta madrugada, antes de o sol nascer, Jorge acordou Wagner as pressas, com duas mochilas cheias de trapos dos dois, e alguns trocados das economias de suas gorjetas que os gringos deixavam, e os dois irmãos foram em busca da liberdade, para a capital da liberdade e do emprego.